Subi
os degraus dois a dois, um grande ramo de flores numa mão e um rasto de perfume
a espalhar-se atrás de mim. Quando cheguei ao patamar do terceiro andar tirei a
cartola, passei a mão pelo cabelo, e voltei a colocá-la, ajeitei o smoking,
endireitei o laço e vi-me reflectido nos meus sapatos impecavelmente
engraxados, depois respirei fundo e toquei finalmente à campainha. Esperei.
Quando estava pronto a tocar segunda vez a porta abriu-se sem que houvesse
alguém do outro lado para me saudar. Hesitei, claro, todos sabemos como os
Ministros podem ser alvo de ataques perpetrados pelas mentes mais perversas,
ainda assim e como homem corajoso que sou, entrei, pisando a alcatifa
vermelho-sangue com passadas seguras. Segui por um longo corredor que
desembocava numa sala ampla, rectangular, duas grandes janelas ao fundo e
sentei-me numa cadeira que se encontrava no centro da sala. Estranhei aquele
facto, como é evidente, afinal era suposto encontrar-me ali com uma admiradora
que conheci na net, uma admiradora que se confessava loucamente apaixonada por
mim e que me tinha enviado uma fotografia que provava como era bela; estranhei
também que aquele telefone estivesse fora do descanso e que aquela voz falasse
sem parar. Por momentos até pensei que fosse a Maria Alice, que me pediu
insistentemente para cancelar este encontro, que era um logro, um embuste, mas
eu percebi logo que aquilo eram os ciúmes dela a falar mais alto e não lhe dei ouvidos.
Depois de muitos minutos sem nada acontecer, só um Ministro sexy sentado numa
cadeira e uma voz a sair do auscultador, acabei por baixar a cabeça,
apertando-a entre as mãos. Foi então que vi sair de uma pequena porta ao lado
do piano um exército de gnomos assustadores, não que eu tivesse medo - nada
disso! – mas depressa percebi que aquilo era gente duvidosa, perigosos
esquerdalhas miniatura, de barba cerrada, camisola de gola alta preta e blazers
de veludo cotelê amarrotados, e então, pressagiando uma situação menos clara,
tirei imediatamente a minha varinha mágica de dentro da cartola e disse com voz grossa enquanto lhes apontava a
varinha: Saiam! Xôoo! É este o momento de abandonarem para sempre esta história!
Mas as minhas personagens não saíam, eram teimosas e indisciplinadas e eu
insisti, de varinha em riste, ameaçando-os, obedeçam-me imediatamente, olhem que
eu sou uma pessoa importante, um figurão governamental! Mas a varinha parecia
um comando de televisão sem pilhas, eu agitava-a, agitava-a, mas ela não me
mudava o canal os gnomos cada vez mais perto e foi então que de modo totalmente inesperado fui atingido na nuca com
um objecto contundente.
Acordei muito tempo depois, amarrado e a ser arrastado
ao longo do corredor para fora desta história, enquanto um fotógrafo falante saltitava em meu redor e me
tirava retratos com uma máquina sem rolo, ameaçando-me com a divulgação das imagens e extorquindo-me a totalidade da subvenção anual do meu Ministério. Na sala ficou apenas a voz, falando ininterruptamente pelo telefone
Dilacera-me o coração dizer-lhe isto, Senhor Ministro, mas eu avisei-o, aquele encontro só podia ser um logro.
ResponderEliminar"afinal a gaja que eu conheci na net era um tarado"
ResponderEliminarahahahahahahahahahahah
(não seria de Ermesinde?)
Sinto-a desorientada, Lady Kina, Passa-se alguma coisa?
ResponderEliminarahahahahahahahahahahahahah
Eliminarpareço, não pareço, Maria Alice?