sexta-feira, 29 de abril de 2016

Então ninguém me acordou?! É quase meio-dia, minha Nossa Senhora das Finanças, e o Professor Marcelo à minha espera para o almoço!

E eu então saltei de dentro dos meus lençóis de algodão egípcio, um salto atlético como só nós, os dos corpos musculados, conseguimos dar, e dirigi-me à casa de banho. Abri a porta e olhei lá para dentro com espanto, o horror estampado no meu rosto de queixo quadrado, a boca aberta e os olhos vítreos, arregalados. Fechei-a muito depressa, sem entrar. Por segundos o meu cérebro genial tentou assimilar aquela informação. Voltei a abrir a porta. Espreitei. E gritei:
- MAAAAAAAAAAAAAAAAAAAARIA ALIIIIIIIIIIIIIIIIIICEEEEEEEEEEEEEEEEE! O que é aquilooooooooo?! Ainda está um daqueles monstros de ontem fechado na minha casa de banho! Agarre-o! Tire-o dali!
- Ora Senhor Ministro, é Pequena Cutxi, a cadela da Dra. Palmier Encoberto que ontem resgatei, um amor de cadela, olhe aquele pêlo, é certo que está um pouco espigado dos ares do mar, que as condições no barco da Dra. Pirata, enfim, já se sabe, mas se lhe fizermos uma máscara hidratante com toalhas quentes tenho a certeza que…
- PORRRRRRRRA ó Maria Alice, eu ainda estou em choque com as agressões de que ontem fui alvo! Quero distância daqueles estafermos, ouviu? Distância! E agora tenho aquilo ali enfiado na casa de banho?! Como se fizesse parte da mobília...?! Como uma jóia de família pronta a ser passada de geração em geração?! Epá, ó Maria Alice, chame a Dra. Palmier e leve-me aquilo dali! Já! Espere, espere! Deixe-me fechar os olhos e pôr a almofada em cima da cabeça que eu não consigo encarar essa assombração apavorante. Pronto, já está. Pode ir.

Fónix, nunca pensei que para ter um blog fosse preciso ser um César Milan…

Diário de bordo

Ainda lua cheia coroava a abóbada celeste quando levei ao gabinete do Senhor Ministro o galão e a pão de Deus com que dejejua. Chamei-o docemente, como chamo sempre, não gosto de entrar de supetão, sujeita perturbar o seu merecido descanso ou suave despertar e arruinar-lhe os humores do dia. Nos seus aposentos, outrora elegantemente decorados, não encontrei senão caos e destruição. Uma matilha enraivecida de Schnauzers tinha tomado o ministério de assalto e o Senhor Ministro era agora seu refém, não obstante a resistência que oferecia, sempre bravo e destemido.
Percebi imediatamente que era a hora de pôr em prática os ensinamentos recebidos na formação e treino específico em 'Gestão de blogo-crises para Secretárias' e determinada que estava a salvar o Senhor Ministro, ali me assumi líder de mim mesma. Tracei objetivos e adivinhei alianças. Cedo realizei que precisava de ajuda superior, não humana. Só pequena Cutxi, também ela sequestrada por Cuca, a Pirata, desavinda com Palmier Encoberto por causa da disputa do título de A Preferida de Dr. Pipoco,  podia dominar aquela matilha.
Ingenuamente procurei auxílio junto de Outro Ente e este, nunca apeando do seu frísio, anuiu. Vim mais tarde a descobrir que se aliou a Cuca, corrompido pela promessa de uma tripulação em biquíni - por que motivo quereria Outro Ente ver Andhriminir em biquíni é coisa que ainda não consegui compreender... Pedi-lhe que me levasse até ao Dr. Pipoco, Blogo-Mestre, mas este testou as minhas capacidades com um silêncio sepulcral. Estava por minha conta e risco e teria de resgatar pequena Cutxi sozinha.
Atei o lenço de seda delicada que trazia ao pescoço na cabeça, rasguei o decote da blusa branca, deixando os ombros e colo de alabastro expostos, disfarcei-me de pirata e infiltrei-me no galeão de Cuca, ancorado no Tanganica. Sabedora da sua lendária bravura, antevi que, frágil como sou, sairia a perder num combate corpo a corpo. Procurei antes explorar as fragilidades do navio e da sua tripulação. O odor vindo da cozinha mostrou-me o caminho. Anhriminir, andrajoso pirata, agora reduzido à condição de cozinheiro, não resistia a um decote bonito. Impressiona-me sempre a facilidade com que homens de barba rija cedem aos caprichos de uma mulher bonita assim suspeitem de que poderão usar-lhe o corpo. Ao aperceber-se da minha presença a bordo e dos motivos que ali me levaram, quis a pirata Cuca fazer-me também sua refém. Surpreendeu-me a sua incúria, seguramente resultado do excesso de confiança que muitas luas de pirataria lhe conferiram, ao determinar que passasse a noite nos aposentos de Andhriminir. Estava a entregar o ouro ao vilão com aquela decisão. Uma pirata experiente não pode subestimar a força de uma mulher apaixonada, por muito frágil que aparente ser. 'Valeroso Andy, destemido Andy', dois suspiros e um olhar lânguido foram bastantes para convencer o cozinheiro de sorriso escorbútico a deixar-me abandonar o navio pela calada com pequena Cutxi no regaço.
Era já madrugada quando cheguei ao palácio Ministerial. Cutxi, como sempre soube, não deixou os seus créditos por mãos alheias e com três sonoros e esganiçados latidos dominou a perigosa matilha, que depois expulsou dali.
O Senhor Ministro, que durante todo o dia se debateu heroicamente, estava finalmente em liberdade. Ajudei-o a despir as roupas esfarrapadas e preparei-lhe um banho quente perfumado com os melhores óleos e essências e passei-lhe a esponja pelo corpo. Escolhi o seu pijama de seda favorito e depositei-o delicadamente sobre os alvos lençóis de algodão egípcio, ajeitei as almofadas de penas, duas, altas e fofas, e saí para aquecer um copo de leite que adocei com duas colheres de açúcar. Exausto deixou-se cair na cama, sem me dirigir uma palavra.

São desnecessárias, sei que no seu coração envergo desde ontem a medalha de A Preferida.

quinta-feira, 28 de abril de 2016

Fónix, ó Maria Alice, já viu o estado em que fiquei?!

Aquela merda não são cães, aquilo são tigres da Malásia! Agora estou para ver quem é que me vai pagar um fato novo! 


Maaaaaaaaaaaaaaria Alice! Ó Maria Aliiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiice!

Ajude-me, por favor! Estou aqui encurralado por esta fera! Nunca julguei que se tratassem de animais tão indómitos e bravios. Passei a noite aqui encostado a esta parede que esta individualidade não me deixou dar sequer um passo! A Dr. Palmier faz isto tão bem! Parece sempre tudo tão fácil e afinal... Ó Mariiiiiiiiiiiiiiiiia Aliiiiiiiiiiiiiice, carago, os meus subordinados estão quase a chegar e eu não queria nada que me vissem aqui, enfim, sitiado! Agarre lá na merda do cão, ó caraças! Se não é um gajo a dar ordens não sei o que seria deste ministério!


quarta-feira, 27 de abril de 2016

Dra. Palmier, Dra. Palmier!

Tenho apanhado todos os Schnauzers com que me cruzo na rua! Retiro-os com gentileza, porém com vigor aos seus pretensos donos, não sem antes explicar que se trata de uma causa muito meritória, a busca de um pobre cão violentamente raptado à sua dona. Veja por favor se algum deles é a Pequena Cutxi!


(Os eleitores adoram sempre um boa história de animais perdidos!)

Panorama desolador no Lago Tanganica

Depois da descoberta macabra da Dra. Palmier Encoberto (na imagem), o inferno desceu ao Lago Tanganica, outrora um local de paz e de beleza inaudita. A constatação de que não era afinal a preferida do Dr. Pipoco, levou-a, num acesso pirómano e vingativo a deitar fogo à vegetação, ali ficando a admirar o resultado dos seus actos devastadores. A polícia já foi contactada e tendo em conta a gravidade da situação, eu próprio, como Ministro da Administração Interna, me encontro no local a coordenar as equipas de bombeiros e as de resgate e salvamento. Porra, ó Maria Alice, pegue lá no extintor e vá ajudar os bombeiros fáxavor! Fónix, se não é um gajo a organizar estas merdas... 


segunda-feira, 25 de abril de 2016

Não há condições

Então eu fiquei fechado em casa para ser um bom deprimindo e verifico agora que os deprimidos foram todos de fim de semana? 

Fónix, isto é deprimente. 

Resumo dos últimos três dias

Agora que este é um blog depressivo, decidi passar um fim de semana extremamente angustiante. Logo na sexta feira fechei tudo, as janelas, as persianas e as cortinas, abri a cama de um só gesto, como se quisesse arrancar alguém lá de dentro, desliguei a luz com um torção letal do interruptor, aconcheguei-me a Titã, o meu caniche anão de cor branca e puxei o edredon para cima da cabeça, fazendo assim uma toca sinistra e abafada. E ali ficámos nas trevas, Titã, arreganhando os dentes raivosos a qualquer raio de luz portador de felicidade que tentasse fazer caminho por entre as frestas das janelas e eu sofrendo de défice de oxigênio que, parecendo que não, um gajo tem dificuldade em respirar ali enfiado. Foi aliás com extrema saudade e até com uma pequena lágrima cristalina que relembrei os bons velhos tempos em que não era depressivo e podia sair à rua para aproveitar o sol e o bom tempo, cheguei mesmo a dizer a Titã enquanto olhava umas velhas fotografias do fim de semana passado: Lembras-te Titã? Bons tempos estes...

Mas já estou resignado a esta nova realidade. Afinal é esta a via do sucesso.

sexta-feira, 22 de abril de 2016

Maria Alice, sente-se aí para me ouvir que eu preciso de desabafar

Espere, espere que esta revelação que lhe vou fazer já tem que cumprir os novos mandamentos deste blog. Deixe-me curvar o meu corpo para a frente, apoiar os cotovelos nos joelhos e mergulhar a cabeça entre as mãos para com elas segurar a nuca e apertar os parietais. Acha que estou bem assim, Maria Alice? Pareço-lhe já com indícios depressivos? Óptimo. Óptimo. O que lhe queria dizer, Maria Alice, é que me enganei. E não foi um engano qualquer, foi um engano grave, não dei atenção às tendências, não pedi um estudo de mercado mais aprofundado e portanto não me apercebi a tempo que um blogger, para ser levado a sério, para ser um bom blogger, tem de entrar na corrente. E a corrente, Maria Alice, o que está em voga, Maria Alice, é ser depressivo. É verdade, Maria Alice, poderia ter sido um romântico-depressivo, um cinzento-depressivo, um urbano-depressivo, um pirato-depressivo, eu sei lá que isto dentro do género depressivo há um enorme leque de escolhas, mas não, não pensei e depois deu nisto. Mas agora, Maria Alice, agora que já vi a escuridão, tomei uma decisão: vamos ser depressivos! Não, não vamos ser só depressivos, vamos ser muito depressivos, dolorosamente depressivos. Vamos ser criaturas angustiadas, deprimidas, deprimentes, melancólicas, macambúzias, olhe vamos ser isto tudo, vamos ser uns sorumbáticos do caraças. Fónix, Maria Alice, isto vai ser um desânimo tal que o pessoal, depois de aqui vir, se vai suicidar para a ponte sobre o Tejo, tudo a saltar lá de cima e o caraças. Agora vá, apague as luzes, feche as persianas, para o ambiente ficar todo ele mais lúgubre e deixe-me aqui sozinho na penumbra, prostrado nesta minha poltrona de couro. Depois eu faço assim este gesto com a mão, está a ver o gesto, Maria Alice? como se estivesse a sacudir um mosquito incomodativo, sem sequer levantar a cabeça, como que diz, vá, vá, quero lá saber, a minha vida não tem sentido.

MARIA ALICEEEEEE, espere aí, já agora, antes de sair, ponha-me aqui uns pingos nos olhos, para dar ares que estou a chorar.

quinta-feira, 21 de abril de 2016

Ai Maria Alice, graças a São Marcelo de Belém que o Dr. Pipoco, o meu Guru, voltou!

Eu sei que ele se ausentou para me fazer um teste, para ver se eu dava conta do recado, mas, Maria Alice, nunca imaginei! Elas sem o Dr. Pipoco ficam loucas, ficam insanas, completamente desatinadas! A Maria Alice vá lá ver se se passou mais alguma coisa nas últimas caixas de comentários que eu nem tenho coragem! Nem dormi esta noite, com receio do que pudesse acontecer... a Maria Alice viu bem do que elas são capazes? Viu? Leu aquelas coisas? Eu sei que o Dr. Pipoco confiou em mim para levar a cabo esta tarefa enquanto ele se dedicava à leitura de livros profundos, mas eu vou ter de assumir, Maria Alice: Sozinho não sou capaz. Não tenho mão nelas! Não tenho, não tenho... Mas isto consome um gajo, Maria Alice, ter de lá ir lá de cabeça baixa dizer-lhe que fracassei... Ai Maria Alice, nem sei que faça, estou capaz de me suicidar que um homem tem a sua honra.
- Senhor Ministro, tem de se acalmar, dê-me a sua mão, vamos fazer um pouco de ioga relaxante.
- Yoga, Maria Alce, a esta hora e quando a minha vida está em cacos?
- Sim, Senhor Ministro, vamos descalçar-nos que estas coisas só funcionam se estivermos em contacto com a Terra Mãe, para as más energias fluírem... deixe-me alinhar-lhe os chakras, Senhor Ministro, tem o Svadhisthana, o chakra esplênico, o segundo, a precisar de um alinhamento severo. Feche os olhos, Senhor Ministro, não vai doer. Sabe Senhor Ministro fiz um daqueles workshops de Reiki aplicado a blogs. O Senhor MInistro não deve conhecer, pois que quem tem aulas particulares de blogs com o Dr. Pipoco não precisa destas coisas, mas há uma escola de blogs que aborda temáticas muito interessante... vamos, Senhor Ministro, feche os olhos e sinta o poder curativo das minhas mãos. Está a sentir? Oooohhh Senhor Ministro, está a sentir? Oooohhh...
- Mas isto funciona mesmo Maria Alice?
- Funciona, claro, Senhor Ministro, deixe-se levar, duvida das minhas palavras? Temos de nos pôr mais à vontade, deixe-me tirar-lhe a camisa, desapertar-lhe o cinto, tirar-lhe as calças, já se sente melhor Senhor Ministro? Oh Senhor Ministro... e agora eu, deixe-me ver livre deste vestido justo que me marca as formas, destes colar de pérolas, deste cinto de ligas incomodativo, se calhar fico só com os stilletos... Ôm, ôm, ôoooooooom...
- Sim, Maria Alice, realmente já me sinto melhor... ai Maria Alice cuidado, não puxe dessa maneira que ainda caímos para aqui os dois no meio do chão. Cautela Maria Alice, que desatino! o quê? é mesmo para nos deitarmos no chão por causa do contacto com a Mãe Terra, é isso? Olhe, que seja, já estou por tudo. Ai Maria Alice, está um bocadinho pesada. Olhe ali o meu colega das Finanças especado do lado de fora da janela, deixe-me só acenar-lhe...

Maria Alice, ainda bem que fomos interrompidos que quase me esquecia... enquanto fazemos esta sessão de ioga relaxante peça lá para baixo, para o gabinete de citações, que me façam um post daqueles em bom, para ver se este blog finalmente levanta voo. Mas feche a janela, Maria Alice, não vá o blog voar-me por ali fora.


quarta-feira, 20 de abril de 2016

Enquanto o cidadão comum se contenta com um singelo cavalo

Ministro que é Ministro nunca faz a coisa por menos de trezentos e nove.


(agora só tenho que pedir o contacto da escola de condução lá ao meu colega, o Professor Cavaco Silva, para reaprender a conduzir sem motorista)

A liberdade dos outros alarga a minha até ao infinito

Depois de ontem ter sido exortado pela Lady Kina a subir a um pessegueiro, que, dizia ela, era necessário ser mais corajoso e correr riscos como já não se correm, e de eu a ter dispensado com um gesto de desinteresse acompanhado de um rolar de olhos, lá está ela a ser do contra, nada de novo portanto, houve ali umas décimas de segundo em que não pude evitar imaginar-me com o meu metro e noventa, camisa branca, botões de punho e fato às riscas, sentado num raminho do pessegueiro, essa árvore robusta e milenar, praticamente uma sequoia, os Secretários de Estado em fila indiana a apresentarem-se para despacho, a Maria Alice lá em baixo, toda ela em cuidados, saltitando à roda da árvore, Senhor Ministro cautela com isso, é melhor descer Senhor Ministro, olhe que os pêssegos deixam nódoa, quer que mande vir uma escada magirus para descer com mais comodidade, Senhor Ministro? Uma plataforma elevatória? Olhe que me parece que o raminho está a ceder, Senhor Ministro, e depois o raminho efectivamente cedia, ouvia-se aquele crrrraque, e a Maria Alice apanhava-me lá em baixo, de braços abertos, cingindo-me no seu amplexo, ai Senhor Ministro que susto me pregou, que perigo! Que perigo! Esta vida de Secretária de Ministro é um risco constante. Acontece que depois, durante a tarde, enquanto assinava papéis muito importantes com a minha Montblanc no meu amplo gabinete com vista sobre o rio, fiquei a pensar no pessegueiro e na questão da Lady Kina, na história da coragem e na necessidade de correr riscos, e decidi que estava na hora de ser mais audaz, de me libertar das minhas amarras e de ousar.

Para já, para já e para começar decidi deixar a gravata em casa e trocar o meu fato cinzento por uma camisa da Ralph Lauren - azul clara com botões no colarinho -, um blazer azul escuro de botões dourados e umas calças bege e, foda-se, sinto-me mesmo um anarquista rebelde.


segunda-feira, 18 de abril de 2016

Em verdade vos digo, também sou um Camiliano assumido

Como aliás se pode depreender da situação que passo desde já a narrar, daquela noite em que, em viagem de Estado, dei por mim a partilhar um quarto com a Maria Alice, não sei como é que ela fez aquilo mas parece que o hotel estava completamente tomado e não lhe sobrava aposento algum e foi então que acabámos partilhando uma mesma alcova, eu sempre de modos dignos, dizendo-lhe, Maria Alice, credo, este hotel é uma autêntica Babilónia, se um homem não se precata, às duas por três não sabe de que freguesia é, e fechei-me à chave na casa de banho de onde saí vestido ratonamente, com o meu pijama de seda com cornucópias abotoado até cima, deitei-me imediatamente no leito, os lençóis rendados esticados até ao pescoço, pus a minha luneta de ouro e debrucei-me sobre difíceis relatórios da res publica e foi então que a Maria Alice saiu da casa de banho, parecia uma celerada, vestida com um baby-doll curtíssimo e repleto de ondas transparentes, fazendo negaças com o pecado, percebi depois que aquela proximidade com o meu corpo lhe dava tratos amaríssimos ao coração, trocando-me o nome, meu Adónis, meu Narciso, dizia ela, e eu:
- O que é lá isso, Maria Alice, sou o Senhor Ministro! e ela nada, com desusada afoiteza dizia "vou-te comer" e eu, claro, suei quando ouvi este canibalismo, suei de aflição, senti até engulhos no estômago, e então disse-lhe com voz grossa:
- Maria Alice, vista o robe de chambre imediatamente e faça favor de pôr a touca e um lencinho de três pontas sobre as espáduas!
Mas a Maria Alice, estava tomada pela perversão, pelas desvassidões de uma extravagante, arrancou-me as cobertas com os dentes, e foi-se aproximando lentamente, de gatas, o decote mostrando aquilo que deve estar tapado, sussurrando, palpitante, "Meu Ministrinho, de hoje não passa!", sinto-me ditosa, ao mesmo tempo que expedia uns grunhidos que me fizeram pavor, e então agarrei-me aos lençóis, puxei-os à altura das bossas parietais e disse:
- Tenho frio!
Mas a Maria Alice não descontinuava a sua investida, as unhas roçagando o meu corpo musculado, o corpo dela estreitando-se no meu até que, contrafeito, lhe disse decidido:
- Maria Alice, eu sou um homem mais interessado no trajar do espírito que nas galanices do corpo! E sem dar tréguas, saltei da cama num empuxão de raiva e gesticulando com frenéticos sacões de braços fechei-me na casa de banho onde tomei como leito a banheira.

Palavra de homem de bem!

sábado, 16 de abril de 2016

Enquanto vou aqui aos solavancos a atravessar o Oceano Atlântico no meu helicóptero

Lembrei-me que era importante esclarecer que um blogger influente não se limita a tirar retratos. Um blogger influente é uma referência do seu tempo, uma inspiração da literatura, um muso no masculino, como aliás se pode constatar neste pequeno trecho do livro Pai Nosso, que nós, bloggers de primeira água, estamos a ler na Tertúlia Virtual de Leitura Simultânea:

Um homem de causas como Eduardo o Senhor Ministro não fica preso a pessoas, aos atilhos das fraquezas alheias, um homem de causas quebra as correntes em nome da acção. Bater-se pela abstracção chamada condição humana era-lhe mais fácil do que aturar um pedreiro ou uma caixa de supermercado, gente que não conhecia bem nem queria conhecer. Quando fizeram fez obras em casa, Beatriz a decoradora boazona encarregou-se dos trabalhos, rodeada dos engenheiros e dos arquitectos e Eduardo o Senhor Ministro aparecia a aprovar com um gesto magnânimo dizendo, Beatriz ó minha BOA amiga, su casa es mi casa mi casa es tu casa. Não ia às compras e não andava na rua porque sair da bolha implicava dar-se com gente sem importância e para aturar gente sem importância tinha [os blogs,] as campanhas eleitorais e as bases do partido. Aí era o rei, vergavam-se a ele. E ele só vergava o joelho a gente mais importante do que ele. Como o presidente dos Estados Unidos da América o Dr. Pipoco.


Lá vai o Ministro apanhar o helicóptero para regressar à pátria.

sexta-feira, 15 de abril de 2016

Status

O Senhor Ministro a sentir-se #claudiafilipado

(Maria Alice, traga-me um conhaque e um charuto, dos cubanos, que a ocasião merece)

E lá vai mais uma, para amortizar a viagem!

Maria Alice, chegue aqui a este cantinho do gabinete, se faz favor, que tenho um assunto confidencial para discutir consigo

- Com certeza, Senhor Ministro, é para já, deixe-me só tirar os óculos de massa preta, soltar o cabelo e abrir este primeiro botão da camisa, ui, que calor! Se calhar fechávamos as persianas, este sol a dar de chapa nas vidraças aquece muito o gabinete. E fechamos a porta. E baixamos as luzes. As lâmpadas incandescentes aquecem muito, sabia, Senhor Ministro? Ai, que calor, sinto-me afogueada. Não quer tirar o casaco, desapertar a gravata? Ui... que Primavera, que até parece Verão!

- Cale-se lá um bocadinho Maria Alice, e fale baixo, olhe lá as escutas, que isto é olhos e ouvidos por todo o lado! Ora diga-me lá, Maria Alice, é verdade que a cidadã Cláudia Filipa se recusou a vir aqui ao gabinete?

- É verdade, Senhor Ministro, e eu assim reclinada para trás e com os lábios entreabertos, estou em posição de confirmar essa informação. E agora, Senhor Ministro, vou ser muito sincera... não a leve a mal, no fundo, no fundo eu percebo-a. Nós, mulheres seguras, somos assim. Difíceis. Além disso, Senhor Ministro, somos leais. Parece-me que a cidadã Cláudia Filipa jamais acederia a um convite seu ali nas barbas do Dr. Pipoco, seria uma afronta, uma traição, um tremendo vexame para ambos, Dr. Pipoco e cidadã Cláudia Filipa. O Dr. Pipoco tem um certo carisma, que tem, não posso negar, é culto e educado, mas não se compara com o Senhor Ministro. O Senhor Ministro é um sedutor nato! Tivesse a cidadã Cláudia Filipa conhecido o Senhor Ministro há mais tempo e garanto-lhe que jamais suspiraria por outro blogger. Mas, como diz o ditado, vão-se os dedos ficam os anéis, mais vale uma pomba na mão que duas a voar...

- Cale-se lá com essa merda, que estou farto de malucas a querer voar. Do que estávamos nós a falar antes de me encolerizar? Ah, já sei, da recusa da cidadã Cláudia Filipa... é que, não sei se a Maria Alice sabe, mas todos os Bloggers de sucesso têm a sua Cláudia Filipa. E nós temos de arranjar aqui uma solução alternativa e temos de o fazer rapidamente! Espere, não diga nada, deixe-me andar aqui em círculos pelo gabinete a pensar... Já sei! O que vale é que eu sou superiormente inteligente e arranjo solução para tudo, não é verdade Maria Alice? Escusa de responder, era uma mera pergunta retórica. Ora, se a Cláudia Filipa não vem até nós, nós arranjamos a nossa própria Cláudia Filipa! Brilhante, não é? Isto é de génio, Maria Alice! A partir de hoje a Maria Alice vai abraçar um novo desafio: vai-me claudiafilipar a caixa de comentários! Tão simples como isso! Agora pode ir que o problema já está resolvido. E abotoe-me essa camisa que ainda se constipa.


quinta-feira, 14 de abril de 2016

Sabem lá o trabalho que dá ver coisas pela janela, ó caraças

É um tal de sobe e desce que não me sobra tempo para mais nada. Nunca pensei que isto fosse uma actividade tão exigente.

Em verdade vos digo

Só cá vim para tirar fotos para o blog.

Um destes dias a Maria Alice também se esqueceu de me avisar que eu tinha um jantar

Já passava das dez da noite quando me entrou no quarto, afogueada, as mãos sobre a cara a tapar as lágrimas de incompetência, com o cabelo num desalinho - por momentos até pensei que fosse a Palmier - Senhor Ministro, disse ela, aconteceu uma desgraça. O jantar com a Senhora Dona Carla Sandra...
- O que tem, perguntei eu. Era hoje, disse ela por entre soluços. Hoje, Maria Alice? Sim, hoje, Senhor Ministro...
- Como é possível que se tenha esquecido da Carla Sandra, Maria Alice? Chegue-se aqui. Já!
Foi então que me levantei muito zangado, deitei a Maria Alice sobre o meu colo e dei-lhe duas grandes palmadas no rabo, para não me voltar a fazer uma destas. Depois enquanto ela dizia ai, Senhor Ministro, quanta virilidade, eu vesti o meu melhor fato, o do Rosa & Teixeira, feito por medida evidentemente, saí com o motorista e os batedores e ordenei: rápido, para a radial de Benfica,  para a casa da Dona Carla Sandra!

O pior foi quando lá chegámos. Nem queiram imaginar a desilusão que a minha anfitriã sofrera com aquele atraso. Aquilo foi um bico de obra, a Carla Sandra estava barricada em casa, sentada no parapeito da janela com as pernas para o lado de fora, coberta pelo fumo da lasanha que àquela hora era apenas um pedaço de carvão a crepitar no forno, tivemos de chamar os bombeiros, o INEM e a Protecção Civil, eu cá de baixo, trancado dentro do carro a gritar por uma pequena greta da janela de vidros fumados, Carla Sandra, não se atire, meu amor, meu querubim endiabrado, foi a idiota da Maria Alice que se esqueceu, sempre com a cabeça no ar. Eu amo-a muito, acalme-se minha coelhinha saltitona, olhe os jornalistas da CMTV que andam sempre em cima destas situações, é a minha reputação política que está em jogo. Mas qual quê, quanto mais eu falava mais a Carla Sandra gritava:
- Se me amasse como diz, meu Ministro da Luxúria, não se tinha esquecido de mim! Eu mato-me, eu mato-me, é desta que eu me mato. E depois atirou-se.

O que vale é que a Carla Sandra vive no rés do chão.


quarta-feira, 13 de abril de 2016

Numa pausa entre reuniões o Ministro olha pela janela do seu arranha-céus e escreve um post filosófico

É natural que o Ministro tenha inimigos nisto dos blogs. Afinal, o facto de ter surgido do nada e munido apenas do seu magnetismo natural ter usurpando de imediato aos outros bloggers as visitas de todo o universo feminino, tornando as melhores leitoras em suas seguidoras fiéis, que o reverenciam e adulam, retirando-as sem dó nem piedade a outros que, por falta de concorrência, se tornaram indolentes e preguiçosos, torna-o um alvo fácil de ódios e rancores. E no fundo é natural que assim seja.


E volta a subir aos céus

O Ministro arrisca a vida, de reunião em reunião, pelas ruas de NY

O que vê da sua janela, Senhor Ministro?

domingo, 10 de abril de 2016

sábado, 9 de abril de 2016

A Invenção do Senhor Ministro

Após um período solitário, um período em que me sentia invisível, como que numa ilha deserta, surpreendi-me com pessoas no meu blog. Não sei como é que elas cá chegaram, mas noto-as por aqui, entrando e saindo, fazendo a sua vida normal, como se eu cá não estivesse. Atordoado com as mudanças, avanço, primeiro a medo, observando-as dissimulado por trás das letras, seguindo-as discretamente até aos seus blogs, conhecendo-as, apesar delas não parecerem notar-me, nem ver-me, nem ouvir-me, numa espécie de existência cruzada em que o meu espaço-tempo não se cruza com o espaço-tempo dos outros, e percebo finalmente que se tratam de fantasmas, avatares que se movimentam como pessoas reais, que tem ideias, deixam comentários, que têm um mundo armazenado nos seus blogs, pronto para ser repetido sempre que assim se entenda, mas que na verdade não passam de uma projecção. E foi então que me deparei com um dilema: contemplar eternamente este mundo ou inserir-me nele e deixar-me aprisionar? Optei pela segunda hipótese, mas as consequências são imprevisíveis.

Nascer do sol no Guincho

Depois bebemos um Nescafé e cantámos o "I can see clearly now the wind is gone"...

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Live from Porto de Santa Maria - IV

Já tirei o maço de notas de dentro da carteira e estou a conta-las uma a uma sobre a toalha. Tau, tau, tau. É para pagar o jantar, uma coisa que me é tão inerente que quase não dava conta.

Agora é que vai ser. Desimpeçam a Sprinter.


Live from Porto de Santa Maria - III

Mirone, está aí? Escuto. Escuto.

Ela diz que está pronta para voar, estou com algum receio que abram as janelas, olhe lá se ela sai disparada pelos céus fora, é arrastada pela ventania e me cai no mar?

Esta merda está escura pra caraças, nunca mais a encontrávamos. E lá se ia a minha noite...

Live from Porto de Santa Maria - II

Mirone, esroiu a teclkar debaixzo da toalçha de mesda enquasnto me finjho pertido nosd olhos delaa. QUe vinhgo peçlo? Bartca Velka ou Quinmta do Vale Meãao? É MElkor pedirt logop para abire 2 ouy 3 garrasfas, nãao?

Live from Porto de Santa Maria - I

Mirone, está aí? Vim num pulinho à casa de banho para lhe dizer que estou com problemas no auricular, a viagem até cá correu bem, vim sempre em terceira, a acelerar, para o motor da Sprinter dar aquele ronronar que impressiona e, com o barulho que aquilo fazia, nem conseguimos falar, o que é um ponto positivo, depois chegámos, pedi-lhe para ela sair para me ajudar a arrumar a Sprinter, que aquela merda é grande comó caraças, destroce, destroce, depois foi segurar-lhe na porta do restaurante para ela entrar, até tive de lutar com o porteiro que o sacana estava agarrado à porta que mais parecia uma lapa, sentar nos sofazinhos ali à esquerda e pedir o gin tónico romântico, com framboesas e pétalas de rosa, passar para a mesa, sempre em movimento, o que não dá para grande troca de ideias, segurar-lhe a cadeira, uma coisa que me é tão natural que quase me esquecia de referir, depois foram as torradinhas, o queijinho, o presunto, os rissóis e, com a boca cheia, já se sabe, nada de conversas, já dizia a minha tia Arnaldina Silva, Duquesa das Infraestruturas e Desenvolvimento Rural, depois veio o gajo das fotografias, que estes gajos estão sempre prontos para tirar fotos ao Ministro. Só que...

Foda-se Mirone, ela pediu peixe ao pão, aquela merda demora uma eternidade! E agora, do que falo?



Eu também as convido para voar

Mas é um pouco cansativo. Bater as asas e assim.

(prefiro levá-las no meu potente carro alemão)


Ela riu-se de modo patético, mas ela também é uma rapariga patética, já tinha reparado nisso

- Às vezes penso que se despertar a sua curiosidade...


quinta-feira, 7 de abril de 2016

Ó João, bofetadas?

Nestas situações eu opto sempre por partir as pernas de quem me critica. É o meu  modus operandi e não me tenho dado mal. 

Bofetadas? Dasse, parecem meninas ó caralho.


Ó Maria Alice, mande lá este comunicado para a imprensa o quanto antes

Tendo chegado ao conhecimento deste Ministério que os bloggers estão todos eles a ficar velhos, vetustos mesmo, o Gabinete do Senhor Ministro informa que o Senhor Ministro está cada vez mais novo. E em forma. E apetitoso.

(Temos que aproveitar estas janelas de oportunidade)

Tudo como o previsto

Por vezes vejo-me obrigado a levar o Aguiar a sair. O Aguiar é um daqueles que jogava comigo ao Monopólio e que, tal como eu previa, não chegou a lado nenhum. É bastante penoso levar o Aguiar onde quer que seja, mas se não for eu a fazê-lo ninguém o faz e por vezes convém-me, como Ministro, fingir que tenho coração e me preocupo com os desfavorecidos. O Aguiar aplica-se muito nestes nossos encontros, afinal não é todos os dias que tem oportunidade de privar com um homem do poder e eu então faço o sacrifício. Levo o Aguiar até um desses sítios onde se dança e enquanto eu me sento lá atrás a beber um gin tónico sem merdas a flutuar, solto-o lá dentro. O Aguiar aproxima-se então de uma de uma morena na pista de dança, todo ele sorrisos, lança os bracinhos para o ar, para mostrar a sua energia, à terceira ou quarta música já faz uns passos mais ousados, uma pirueta até, depois bate palmas a acompanhar o ritmo da música, frenético, e por fim, quando acha que a batalha está ganha, decide-se a meter conversa e sussurra-lhe umas palavras ao ouvido. A morena que nem sequer o tinha visto, olha para ele pela primeira vez, faz uma careta alarmada e afasta-se rapidamente. Tudo como o previsto, portanto.

É uma maçada esta coisa dos mercados a funcionar livremente. Enquanto o Aguiar se esforça sem sucesso, o Ministro não tem que fazer rigorosamente nada. Basta sentar-me lá atrás a beber o meu Gin Tónico.



quarta-feira, 6 de abril de 2016

Mas o pior de tudo, pior que o contacto directo com o povo, talvez sejam as reuniões temáticas

As reuniões temáticas são, e neste momento é preciso dar um exemplo que esclareça o cidadão leitor que pode estar confuso a pensar que são reuniões marcadas para um clube de férias organizadas num país tropical, com pensão completa e pulseirinha, em que o Senhor Ministro vestido de branco e descalço, bamboleia  o seu corpo com os seus congéneres ao som d'a Garota de Ipanema enquanto fumam charutos cubanos e bebem uma margarita, e é preciso explicar que não, que as reuniões temáticas não são nada disso, as reuniões temáticas são uma coisa séria e mais comum do que se possa pensar, são por exemplo as reuniões com o Director Geral da Pecuária e Pastorícia do Alto Alentejo, um homem de cabelo branco encaracolado e olhos bovinos que lhe imprimem uma certa aparência de borrego, que se apresenta com umas botas caneleiras por fora das calças e uma samarra com gola de pelo de raposa, numa caricatura fiel do pastor acabado de sair do curral.

Claro que nesses momentos o Ministro fica muito apreensivo, de olhos postos na porta, desconcentrado, à espera do momento em que se junta a nós, na mesa de trabalho, um rebanho de ovelhas.



terça-feira, 5 de abril de 2016

O que vê da sua grande secretária de raiz de nogueira, Senhor Ministro?

Postas perante o Ministro dá-se como que um encantamento, os meus colaboradores personificam instantaneamente o jovem inteligente e dinâmico, os olhos brilhantes, os lábios frescos, o instinto matador à flor da pele, o sorriso encantador a fechar o embrulho. Quando se deslocam não andam, escorregam, quase patinam, se lhes fosse possível voariam pelo gabinete, numa azáfama de Secretários de Estado, assessores e secretárias superexcitados, a bater as asinhas,suspensos no ar, presos ao tecto, pousados nas paredes, a aproveitar todos os segundos para provar a sua eficiência, eles com as gravatas à banda, elas com o penteado desfeito numa poupa que se levanta em virtude da rapidez com que se deslocam nos seus saltos altos e saias travadas, tão depressa estão ali como de repente estão aqui, nem se percebe como venceram aquela distância, é impossível prever as suas trajectórias, sim Senhor Ministro, com certeza Senhor Ministro, é para já Senhor Ministro, todos, à vez, aproximando-se com respeito, debruçados sobre mim, uma mão a tocar-me o ombro dando a entender aos demais uma cumplicidade que não existe, criando a aparência de um momento de quietude, quase terno, mas depois o salto provocado pela tensão interna que os leva a fazer, a executar, a concretizar, a serem hiperdinâmicos, provando-me que lhes é impossível estar parados durante muito tempo.

(foooooda-se, parecendo que não isto cansa a cabeça de um gajo!)


segunda-feira, 4 de abril de 2016

Um breve vislumbre sobre a infância da Secretária

Ainda não tinha completado cinco anos e já a avó Isaura me confiava o pequeno porta-moedas com fecho de prata que me deixava as mãos a cheirar a verdete. De cabelo aprumado, meias de renda de algodão branco que nasciam como que por magia das 5 agulhas que a avó manejava com mestria e sapatos irrepreensivelmente engraxados, saía da Travessa das Isabelinhas, sempre de passo apressado, fazia a Rua das Madres até ao n.º 4 da Travessa das Inglesinhas. Ali chegada cumprimentava o senhor Casimiro e o papagaio Pascoal, que lhe tinha trazido de Angola um compadre que agora vivia na Graça, e pedia o costumeiro avio, um pão de Mafra e uma garrafa de leite. Ao sábado também comprava manteiga fresca. 

Nunca nas dezenas, se não centenas, de recados que fiz a pedido da avó Isaura me enganei ou deixei que enganassem no troco, nem mesmo quando ainda não sabia ler. Já na altura tinha consciência da importância que tem saber cumprir ordens com diligência.

Um breve vislumbre sobre a infância do Ministro

Já com cinco anos fazia milagres a jogar ao Monopólio, o dado a rolar, o meu capital a multiplicar-se continuamente, a Rua do Ouro, a Rua Augusta, a Avenida de Roma, a Rua Ferreira Borges, tudo meu, hotéis atrás de hotéis, hostels, Guest Houses, já a antecipar o boom do turismo lisboeta, sentado numa ampla mesa de reuniões, uma máquina de calcular de um lado e uma daquelas dos bancos, de contar notas, do outro, enquanto via os meus amigos sentados no chão, a irem parar à prisão, a pagar à Caixa da Comunidade, a serem obrigados a passar a casa de partida sem receberem o respectivo prémio, um após outro a declararem a bancarrota, a transformarem-se nuns pobres indigentes. E a Mariazinha, que já nessa altura prometia, a entrar com uma farda de enfermeira a gritar "deixem passar a Troika" para os resgatar da falência, pobres criaturas arruinadas, e eu que já nessa altura era um liberal a gritar-lhe: "deixem os mercados funcionar, se é para falir é para falir!". E no fim a criada chamava-me à porta a bichanar, com medo de interromper os meus negócios: "Menino Ministro o almoço está na mesa". E eu então levantava-me, arrumava as minhas notas de papel na carteira Louis Vuitton, punha a minha cartola, um objecto de família passado de geração em geração, e os meus amigos, pressentindo o meu poder de liderança, levantavam-se do chão reverentes, para me seguirem até à casa de jantar onde eu me sentava a degustar uns scaloppine saltimbocca e eles se deleitavam a observar-me.

Nunca os convidei para se juntarem a mim. Era evidente pelas suas performances que não me seriam úteis no futuro.

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Estava ali a ver o meu colega Passos Coelho enquanto assinava uns papéis

E ocorreu-me que ele devia fazer uma coisa surpreendente, vestir umas calças de cabedal com correntes, pintar o cabelo de castanho caju, usar um brinco com pingentes roxos, aparecer vestido de Darth Vader, fazer uma merda (é a Tourette) qualquer para provar de uma vez por todas que, ao contrário do que alguns esquerdalhas maldosos insinuam, ele é um homem do futuro. 

Vou mandar-lhe um sms.

E enquanto eu dizia coisas importantes e as pessoas que me rodeavam apontavam rápida e disfarçadamente as minhas ideias num caderninho, não fossem elas fugir

Reparei que de cada vez que ela se levantava da mesa lá ao fundo, caramba era impossível não reparar, a outra mulher, a que estava sentada na mesa à minha frente, quase nem se dava por ela, cravava os olhos nos olhos do homem que a acompanhava, para garantir que ele não desviava dali o olhar. E sentia-se ali uma luta dolorosa. O homem a esforçar-se por olhar em frente e os olhos, esses velhacos, não lhe obedeciam e a mulher seguia-lhe a linha do olhar, dele para a outra, da outra para ele, os olhos dela semicerrados, transformados numa fenda.

E eu então, descurando a minha integridade física e até a minha vida, pedi aos seguranças para os acompanharem quando saíram. De certeza que ele hoje vai ter problemas.